quarta-feira, 24 de dezembro de 2008

Os sem Natal que vagam pelas ruas


Nesse período do ano estima-se que a população em situação de rua na capital baiana cresça em aproximadamente 80%. De acordo com a Secretaria Municipal de Desenvolvimento Social (Sedes) muitas destas pessoas são oriundas do interior do Estado e aproveitam o espírito natalino para conseguirem roupas, cestas básicas e principalmente brinquedos. Homens, mulheres e crianças disputam espaço nos diversos pontos da cidade na tentativa de serem afortunadas por um “Papai Noel”. Com apenas seis anos de idade, a pequena Rebeca, tenta brincar com os irmãos e primos na grama da Avenida Marechal Castelo Branco, nas proximidades da estátua que carrega o nome do militar. Corpo franzino, cabelo escuro e pele queimada do sol, Rebeca tem sonhos como qualquer outra criança da sua idade. Passou o ano sonhando com uma boneca Barbie, mas por causa das poucas condições financeiras dos pais – desempregados – a vontade continua no sonho. Na tarde de ontem, a cada carro que diminuía a velocidade naquele trecho da Avenida, os olhos de Rebeca pareciam brilhar. A garota levava o olhar para o interior do veículo na tentativa de perceber a presença da tão sonhada boneca. Em poucos segundos ela voltava a realidade e os olhos paravam de brilhar no momento em que o condutor acelerava e sumia da via. Com idades de 7, 4, 3, 2, e nove meses, os irmãos de Rebeca também têm sonhos tímidos. O mais velho sonha com uma bola. “Para eu jogar futebol”, enfatizou. Com quatro anos, *Laura tem um desejo simples, mas bastante significativo para a maioria das crianças da sua idade. “Quero conhecer o Papai Noel e perguntar por que ele nunca foi na minha casa deixar presente”, disse com um ar de interrogação. Com três e dois anos de idade elas também anseiam por uma boneca. Com apenas 23 anos de idade, a desempregada *Maria carrega na face as marcas da dificuldade que a vida lhe reservou. A mãe das seis crianças veio para a capital com o objetivo de passar um Natal mágico. “Queria que eles ganhassem brinquedos. Passaram o ano todo vendo brinquedos na televisão e me pediam, mas infelizmente não pude dar. Eu e meu marido estamos desempregados e o que ganhamos mal dar para comer. Às vezes falta até comida em casa”, disse enquanto dobrava o único colchão que dorme com a prole. De acordo com ela, a iniciativa de vir para Salvador se deu depois que percebeu a quantidade de pessoas que saíam do interior rumo a capital. “Achei que fazendo isso podia melhorar o Natal dos meus filhos. Eles têm sonhos como eu tive. Quando era pequena queria ter uma boneca que chorasse”, disse a jovem mãe e confessou. “Também tenho vontade de conhecer o Papai Noel. Ele é muito lindo com aquela barba branca”. O sonho natalino parece estar a cada instante mais longe daquela família que tenta se abrigar ao tempo. Hoje, véspera de Natal é o dia em que muitas pessoas se reúnem nos seus lares com familiares e amigos para festejarem o nascimento do Menino Jesus. Troca de presentes e amigo secreto fazem parte dos festejos, não se pode esquecer também a ceia. Mesa farta, com doces, salgados e comidas da época enchem os olhos e recheiam o estômago. Longe de casa, a família da pequena Rebeca parece que vai passar a noite natalina na Avenida que escolheu para se abrigar. Pai, mãe, filhos, sobrinhos e primos estão reunidos. No lugar dos presentes sonhos frustrados de crianças que desejavam bonecas, bolas e até conhecer o Papai Noel. A ceia com guloseimas deu vez a latas vazias.


Tribuna da Bahia

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