segunda-feira, 14 de setembro de 2009

“É uma reforma doméstica” Maurício Rands

A um ano de terminar o mandato do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e a tão esperada Reforma Eleitoral não sairá, efetivamente, do discurso. O texto, discutido e aprovado no Senado semana passada, não passa de “procedimentos” já existentes e objetos de várias resoluções da Justiça Eleitoral e que precisavam ser regulamentados pelo Congresso Nacional. Para o deputado federal, Maurício Rands (foto) (PT), a não aprovação de uma reforma “profunda” para mudar o sistema eleitoral brasileiro, hoje suscetível à corrupção, “é uma vergonha”. Nesta entrevista, ele fala da lei de procedimentos, critica alguns pontos, mas ainda assim considera a matéria um avanço. Também discorre sobre o Processo de Eleições Diretas (PED) do PT, da disputa do Senado e das candidaturas à Presidência da República da ex-petista, Marina Silva (PV), e do aliado Ciro Gomes (PSB).

Reforma eleitoral
É uma vergonha que mais uma legislatura não se faça essa reforma política. Continuo achando que ela é uma reforma estratégica para mudar não só as práticas políticas no Brasil como para aperfeiçoar o funcionamento das instituições e para diminuir a corrupção, a força do poder econômico. Mas não é a reforma eleitoral que o País precisa. O Brasil precisa de uma reforma eleitoral muito mais profunda para mudar o sistema eleitoral que hoje está muito permeável ao poder econômico e à corrupção, que faz com que o estado brasileiro tenha um processo decisório fraco e faz com que haja pouca discussão programática e ideológica.

O que muda
É uma reforma cosmética. É muito mais uma lei de procedimentos que, antes, era objeto de várias resoluções da Justiça Eleitoral. Regulamentar uma eleição é competência do Congresso Nacional. Pelo menos esse ano o Congresso está exercendo seu dever constitucional de legislar. Como ele não legislava em matéria de procedimento de cada eleição, a Justiça Eleitoral, à guisa de regulamentar, na verdade, estava legislando. Estávamos vivendo um momento inconstitucional. A Justiça usurpava competência do Congresso que dessa vez assumiu sua prerrogativa.

Pontos da reforma
A internet foi o que despertou mais polêmicas. O Senado tirou a introdução do voto impresso por amostragem que foi votado na Câmara e tem muita gente que quer voltar esse texto. Continua proibida a propaganda em muros e outdoors. Aí tem a minha discordância e de outros deputados. O outdoor deveria ser um instrumento utilizado na eleição no Brasil. Foi proibido no texto do Senado, mas vamos tentar reintroduzi-lo na próxima votação na Câmara. Outros pontos importantes são o que proíbe a participação de candidatos quatro meses antes da eleição em eventos de inauguração e assinatura de obras de serviços, o lançamento de programas assistenciais, ressalvado o direito, evidentemente, de corrigir benefícios já instituídos e já previstos na lei orçamentária. Tudo somado, acho que essa lei vai fazer com que haja um aperfeiçoamento nas regras de funcionamento das eleições de 2010.

Aplicação das regras
O texto vai chegar esta semana na Câmara e na semana seguinte já podemos enfrentar a matéria. Há uma consciência clara de todos os deputados de que temos que votar essa lei eleitoral de procedimentos, porque se não votarmos a Justiça Eleitoral, sem o maior conhecimento de como funciona uma eleição, vai querer regulamentar e novamente invadir a esfera de competência do legislativo. Então, até para que a Constituição seja respeitada, precisamos votar. Então as regras já serão aplicadas na próxima eleição.

Avanços
São avanços com relação às outras eleições. Mas, repito, nada que possa substituir a necessidade de uma reforma política profunda para que a política brasileira seja resgatada. Nós temos que fazer na minha opinião uma reforma política profunda para que a democracia brasileira seja mais capaz de dar as respostas que o povo precisa.

Infidelidade partidária
Esse item não foi mexido. Aquela janela de oportunidades de que se falava não foi criada. Então, continua o entendimento de que os políticos só podem mudar de partido se tiverem uma demonstração inequívoca de um confronto programático ou de uma perseguição por parte da diretoria.

Pré-sal
Estamos (os deputados de Pernambuco) mobilizados. Tivemos uma reunião com a bancada do Nordeste e deliberamos apresentar emendas ao projeto de modo coletivo. Tivemos uma reunião com o governador (Eduardo Campos - PSB) para mostrar que, independente de partidos políticos, estamos coesos enquanto representantes do povo de Pernambuco para que os recursos do controle da camada de Pré-sal sejam mais bem distribuídos. Não aceitamos, sobre qualquer hipótese, a proposta do Rio de Janeiro e Espírito Santo de que o brasileiro que nasceu nesses estados sejam mais brasileiros do que os sertanejos do Nordeste, do que um morador do Rio Grande do Sul, um habitante do Pantanal ou dos polos amazônicos. Vamos para a briga até as últimas consequências. Todos são igualmente brasileiros. E esses recursos do subsolo, diz a Constituição no seu artigo 20, pertencem à união que é formada por 27 estados e 5.465 municípios. Portanto, pertence ao conjunto do povo brasileiro. Não vamos deixar aprovar qualquer legislação que garanta a continuação de um modelo concentrador que levou o Brasil a ser esse País com tanta desigualdade social e regional.

Posição de Eduardo Campos
A posição do governador foi muito firme, inclusive na semana do lançamento do pré-sal ele teve praticamente um entrevero retórico com o governador Sérgio Cabral (DEM/ RJ), mostrando que não tem nenhuma fundamentação de justiça querer continuar com o tratamento desigual, com um lucro concentrador. Ele já se beneficiou durante todos esses anos, ainda quer se beneficiar para o futuro?

Oposição
Está engajada pelo interesse do Estado. Pernambuco sempre teve uma disputa política muito radicalizada, mas, nesse momento, estamos tendo muita maturidade política.

Tensão no PED
Conversei nos últimos dias com João Paulo (secretário de Articulação Regional) no sentido de que a gente tem que criar uma ambiência para que o PED (Processo de Eleições Diretas do PT) seja feito num debate sereno de ideias e que não haja as tensões que se registraram no PED passado. E acho que isso é possível. Porque o partido cada vez mais se compenetra de que enquanto estiver só voltado para a disputa interna vai se enfraquecer na disputa maior que é um projeto de sociedade. Que projeto o PT tem para Pernambuco, para o Brasil? Como o PT se relaciona com os grandes avanços do governo Lula, do governo Eduardo? Como o PT apoia as prefeituras que ele faz parte? Que modelo de sociedade queremos e que valores nos faz sermos petistas, socialistas, de esquerda? Isso é que é mais importante do que as diferenças de táticas e estratégicas de cada corrente. Elas existem, mas não podem ser concentradoras de toda a movimentação política de seus militantes.

Fator Marina Silva
Acho que a candidatura de Marina tem impacto, sem dúvida, e pode até alterar o resultado das eleições. Torci para que ela não saísse do PT, porque nosso partido tem sim uma preocupação ambiental. E é por essa razão que ela e outros militantes na luta pelo meio ambiente construíram também esse partido. Não é por outra razão que ela foi ministra do governo do PT durante sete anos. Não é por outra razão que todos nós temos uma atuação na área ambiental. Eu, por exemplo, tenho seis projetos de lei apresentados na área de meio ambiente. Gostaria que ela tivesse continuado no PT.

Ciro Gomes
É um grande aliado, inclusive tenho por ele um carinho especial, ainda torço para que ele integre a nossa chapa. Acho que ele poderia também ser candidato a presidente, que fosse o candidato de unidade de todas essas forças. Ele está absolutamente credenciado. Mas nesse momento acho que a candidatura de Dilma (Rousseff/PT) cumpre mais esse papel de aglutinador dessas forças que hoje dão sustentação ao governo Lula. Mas poderia ter sido Ciro também o aglutinador. Mas como acho que Dilma está cumprindo mais esse papel de juntar todas essas forças e ser a continuidade, é a candidata impecturis do presidente Lula, o ideal era que Ciro, que o PSB, já compusessem com o PT desde o primeiro turno.

Dilma Rousseff
Acho que ganha a eleição. A sociedade está percebendo que esse projeto não é de uma pessoa só, não é de Lula. O governo de Lula é bom por conta da participação, do acúmulo da experiência do PT e dos aliados, nas câmaras, nas assembleias, nas prefeituras, no governo do Estado na Câmara Federal e no Senado. Esse governo é bom porque tem a participação dos sindicatos, das organizações da sociedade civil que lutam contra as discriminações. Lula é o primeiro a reconhecer isso. Na medida em que o debate for se aproximando, aquelas pessoas que queriam que Lula disputasse um terceiro mandato vão perceber que o terceiro mandato é com Dilma que dará continuidade a esse projeto de crescimento com inclusão social.

Jarbas candidato
Dificilmente ele vai ser candidato. Ele é hoje um político praticamente isolado no cenário nacional, no Senado tem sido um político isolado e tem dado declaração à Imprensa que não se encontra motivado. Uma candidatura, no meu entender, tem que ter compromisso programático, motivação do candidato. Jarbas Vasconcelos, ao que tudo indica, não tem motivação. E a razão dele, além da falta de motivação, é que ele sabe que dificilmente terá condições de derrotar seu arquiinimigo, Eduardo Campos, que é franco favorito para governar Pernambuco. Tem feito um bom governo, tem atraído investimentos. Então, Jarbas sabe que se for candidato vai ter que confrontar os oito anos de governo dele com os quatro de Eduardo que, em quatro anos fez mais do que Jarbas em oito.

Disputa do Senado
Os dois senadores que vierem a integrar a chapa majoritária deste projeto que é vitorioso no plano federal e estadual tendem a ser eleitos. Eu até não descartaria que os atuais senadores (Marco Maciel e Sérgio Guerra) pensem em outra disputa que não enfrentar o Senado. Se Jarbas não for candidato e a gente continuar tão bem como está, acho que eles não estão ainda seguros de que serão efetivamente candidatos.

Candidatura de João Paulo
Esse assunto não está resolvido. O PT está concentrado em fazer um debate sadio nas eleições do PED. No começo do próximo ano, vamos com muita serenidade e tranquilidade escolher o representante do PT na chapa majoritária, para as eleições de 2010. O PT é um partido que tem muitos setores, tem vida orgânica, tem muitos quadros preparados. Evidentemente o PT não se resume apenas a um quadro, ou dois. Não é natural um partido que tem muitas correntes ter uma só ocupando todos os espaços majoritários nas sucessivas eleições. Portanto, a escolha do nome vai ser produto da discussão programática do partido, do equilibrio que deve haver em seus diversos setores e do reconhecimento de que o PT é um partido de muitas lideranças, não de um cacique só.

Popularidade de Lula
É um reflexo dos resultados do governo do PT e dos aliados, além do carisma pessoal do presidente. É o melhor governo que o Brasil já teve em toda sua história. Um governo que avançou na Educação, na satisfação das necessidades básicas da população. É um governo que, evidentemente, não poderia em um espaço curto de tempo resolver todos os problemas do Brasil. Esse período vai ficar devendo algumas questões que precisam ser aceleradas no próximo período, num terceiro mandato de lula que vai ser com Dilma, assim espero.

Queda na popularidade de Lula
É impossível alguém ficar sempre na estratosfera. Mas essa queda de Lula não impede de percebermos que ele goza de um índice de aprovação notável. Queriam os demais governantes do mundo continuar com o índice de aprovação que tem Lula. Não é por outra razão que a oposição tem tanto receio de confrontar Lula. Com a derrapagem, Lula ainda tem um patamar muito alto. Um patamar ao qual Fernando Henrique (PSDB), em seus melhores momentos, nem perto chegou.

Folha de Pernambuco

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