quinta-feira, 30 de outubro de 2008

Bem mais que beleza por baixo do véu dessas meninas

Dança do Ventre // Hérica, Zemile e Talita nasceram com Down mas não escondem o rostoMirella Marques // Diariomirellamarques.pe@diariosassociados.com.br

Com muita alegria, as três já conquistaram espaço em programas de televisão e eventos.
Foto: Alcione Ferreira/DP/D.A Press


Assim que a música árabe começa a tocar no pátio, o clima de mistério toma conta do ambiente. Os olhares, fixos. Cobertas por véus nas cores vermelha, branca e azul, três jovens emprestam seu charme à milenar dança do ventre. Elas requebram os quadris, mexem delicadamente as mãos. E, durante toda a coreografia, conseguem prender a atenção dos presentes. Emocionam. Encantam. Seduzem até quem está passando, de bobeira, pelo local. Minutos depois da entrada triunfal, elas mostram os rostos, contornados por longos fios de cabelos. Os olhinhos puxados, recém-descobertos, revelam que as três nasceram com Síndrome de Down. Elas são as únicas dançarinas do ventre com Down no estado. A fama já rendeu participações na TV e em eventos comemorativos. Além do reconhecimento, a dança trouxe de volta a auto-estima e a alegria de viver do trio.

Zemile Kasala Santos, 17, Hérica Guilherme, 26, e Talita Paula da Silva, 24, começaram a dançar juntas há apenasum ano. Elas se conheceram no grupo de dança do Núcleo de Atividades Culturais e Esportivas para Pessoas com Deficiência, no Complexo Esportivo Santos Dumont, em Boa Viagem. Ao lado de outros 12 integrantes, elas participam de aulas de xaxado, forró e samba, ministradas pela professora Amara Sales. A coreografia da dança do ventre, no entanto, foi criada por Zemile. "Desde os 12 anos ensaio os passos no espelho da área de serviço da minha casa. Depois, ensinei tudo às meninas", contou. A adolescente levou quatro anos para realizar seu sonho. "Tentava matriculá-la em classes de dança do ventre normais, mas nenhuma professora a aceitava, porque ela era Down", relembrou a mãe de Zemile, Laudicéa Santos

Sozinha, a jovem comprou um CD de música árabe e repassou o que sabia às colegas. Sempre depois das aulas do grupo de dança misto. "Não dava para ensinar os meninos, né? A dança do ventre é feminina. Eu fiquei mais vaidosa", lembrou Talita. Meses depois, as três foram chamadas para apresentações em aberturas dejogos escolares, congressos, programas de televisão e festas. Elas ainda não recebem cachê. Ainda. Cientes do sucesso das meninas, as mães passaram a investir até R$ 200 em roupas, véus e maquiagem para os "shows". O investimento compensa. "A dança do ventre mudou minha vida. Antes, me achava feia. Hoje, me sinto linda. Principalmente quando as pessoas olham para mim. Quem não gosta muito é o meu noivo", admitiu Hérica, entre risos. Aos fãs, um aviso. Com exceção de Talita, as outras duas integrantes do trio já estão comprometidas.

Sala? - O grupo de dança das meninas ensaia às terças e quintas-feiras no pátio da Diretoria Especial do Santos Dumont. Sem espelho e sem tablado adequado. É com dificuldade que os alunos conseguem ouvir o som que sai do pequeno gravador portátil trazido pela professora nos dias de aula. A coordenadora pedagógica do Núcleo de Atividades Culturais e Esportivas do Santos Dumont, Rosângela Maia, disse que a atividade favorece à socialização. A professora de dança não concorda. "Háanos luto para a gente ir para um sala de verdade. Com espelho, eles poderiam corrigir os passos com mais facilidade", retrucou. Por enquanto, é no pátio que as três dançarinas se preparam para ganhar o mundo. O contato pode ser feito pela manhã no 3184.2668.

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